Greta Garbo auto ostracizou-se do paparazzico mundo dos holofotes hollywoodianos dizendo, no final da sua última entrevista, a décima quarta de toda a sua carreira: I want to be alone. I just want to be alone! A estrela, doravante, dedicou-se à jardinagem solitária, no quintal do seu desejado anonimato. Garbo trocou os estúdios – e suas gentes – pela orgânica companhia de suas plantas, com quem, certamente, gostava mais de trocar. Não sabemos se ela falava com seus gerânios e margaridas, porém, certamente eles lhe diziam mais e melhores coisas.
Por mais difícil que seja imaginar alguém dispensando a sua própria celebridade, uma Garbo contemporânea publicaria no seu twitter um memético #meerra. Depois disso, gastaria o resto dos seus dias navegando escondida sob algum perfil facebookiano falso, jardinando na daninha rede-social-virtual madrugadas adentro. Hoje, quando alguém quer se afastar do mundo, é à sua versão virtual que recorre, pois essa é a forma de não estar no mundo sem com isso deixar de ocupar, embora virtualmente, o seu centro.
Portanto, não é apenas distanciamento que se encontra na internet, mas também proximidade absoluta. Por isso, on-line, pode-se fugir do mundo sem deixá-lo, ou adentrá-lo deixando-o. Independente do sentido em que tomemos a virtuália, no final das contas a conta final chega sempre ao mesmo resultado, ou seja, um equilíbrio desequilibrado entre realidade e virtualidade que, não obstante, foi-nos sempre familiar. Antes das hiperconexões digitais era nas intrafronteiras subjetivas individuais que nos refugiávamos, a despeito direto das objetividades mundanas solicitantes.
Porém, na internet, encontra-se outra espécie de refúgio. Neste, em vez de introspectar-se subjetivamente, desobjetivando-se, como fez Garbo, o indivíduo logado objetiva sua subjetividade em função e na direção daquele mundo que ficou de fora dos cinquenta centímetros entre os seus olhos e o écran luminoso. Pode-se pensar, sugestivamente, que o novo espaço subjetivo do indivíduo contemporâneo é justamente esse existente no curto espaço que separa – e sintomaticamente une – o mundo real e o virtual.
E o que vem a ser a torrente de compartilhamentos de fotos e pensamentos das pessoas no exato instante em que elas estão experienciando suas vidas? São justamente os momentos de maior intensidade subjetiva, ou seja, aqueles onde se está feliz, inspirado, solitário, surpreso, incrédulo, etc., os que imediatamente são publicados, como que reivindicando, virtualmente, uma corporeidade real. Recentemente, uma amiga postou no Facebook: “esse momento está tão bom que nem vou postá-lo no Facebook”. Sua ironia foi ouro, mas ainda assim precisou do latão virtual para solidificar a liga daquele seu momento especial.
As experiências contemporâneas, por conseguinte, estão carecendo cada vez mais de uma existência duplicada, de um suporte virtual, para merecerem existência lá no cerne do sujeito que as protagoniza. Talvez a duplicação virtual ainda seja pouco para que o indivíduo sinta que realizou algo, pois, uma vez na rede, nossas experiências são, na verdade, replicadas, isto é, multiplicadas à potência da nossa lista de amigos. Tantas vezes é o número de “likes” recebidos em uma experiência postada o termômetro para a própria pessoa que postou dizer a si mesma o quanto ela “like” o que experienciou.
A Greta Garbo atual estaria sazonalmente postando fotos das suas floradas, curtindo todas as comunidades de amigos do verde e as da casa&jardim, protestaria digitalmente acusando os vegetarianos de assassinarem impiedosamente os vegetais, etc., tudo isso somente para preencher a sua tão desejada solidão. A Solidão solitária virou coisa de filme de Hollywood! Hoje, a solidão se dá em comunidade global, na plena conexão com o mundo. De certa forma, a virtuália internética é a via através da qual nos auto-ostracizamos não do mundo, mas sim do jardim secreto das nossas densas – e desde sempre solitárias – subjetividades, e em direção dos holofotes sociais virtuais.
We don’t want to be alone. Não! We just want to be on-line! E estamos, não?