É absurdo e ilógico o Brasil ter elegido o PT e não PSDB considerando a lógica do movimento econômico mundial de concentração cada maior de riquezas nas mãos de cada vez menos famílias-conglomerados. O mundo em que vivemos está feito para que as fortunas aumentem e coagulem-se, pois quem é rico não encontra limites para a sua riqueza; entretanto, essa conta que não fecha é parcelada em árduas prestações à-perder-de-vista na conta do povo. O não-comunista Thomas Piketty, no seu polêmico “O Capital no Século XXI”, comprova cientificamente esse desequilibrado e desequilibrador quadro pintado pelas crescentes fortunas em cuja centralidade apenas elas devem figurar.
Porém, com a vitória do Partido dos Trabalhadores, atribuída por muitos exclusivamente ao benefício bolsa-família, o Brasil vai à contramão do sórdido movimento capitalista mundial que prioriza a riqueza de poucos em relação à pobreza da maioria. A sobreposição – indigesta para as elites – dos mapas brasileiros de votos presidenciais e de distribuição de benefícios sociais é uma afronta ao maquiavélico modelo macroeconômico global. Todavia, esse mapa é a rota de fuga escolhida pela justa maioria dos nossos cidadãos para longe das desventuras do capital que insiste em usar a todos para concentra-se nas mão de poucos.
Intrigante é quase cinquenta por cento dos brasileiros defenderem o insustentável modo liberal-oligárquico encarnado atualmente pelo PSDB, dado que essa gorda fatia da população não é, de modo algum, a minoria rica que se beneficiaria caso Aécio encabeçasse os desígnios desse país. Antes, é uma maioria não-rica enganada por uma minoria rica no sentido de viabilizá-la à manutenção histórica e ao aumento vindouro da sua fortuna privada. Ou, por ventura, o professorzinho municipal pindamonhangabense, por exemplo, seria beneficiado através do acorde brasileiro com o movimento econômico internacional evidenciado por Piketty e defendido por Aécio?
Portanto, a contramão que o PT e Dilma representam em relação ao PSDB e Aécio é bem-vinda! E isso por conta da inédita distribuição da densa renda Sul-Sudestina na ascensão, socialização, urbanização e saneamento do Norte-Nordeste historicamente preterido no jogo político nacional. Dilma é bem-vinda sim, pois a riqueza de um país é a riqueza individual de cada cidadão, e não a alta riqueza de uns poucos – coisa que a direita mantém escondida sob a promessa liberal de felicidade atrelada à desigualdade econômica e social. A diminuição da desigualdade em curso no Brasil é dissonante da melodia mercadológica mundial, por isso ameaça e inquieta toda e qualquer fortuna privada. Porém, esse “jazz impertinente”, que destina-se mais ao povo que à elites, foi o jingle vencedor que manteve o PT no poder.
Acredito que o “estarrecimento” das elites a respeito da distribuição de renda aventurada nos doze anos de PT resida no fato dela ser, estratégica, temporária e subversivamente desigual. Entretanto, devemos entender a virtude que uma desigualdade funcional pode ter no saneamento de uma desigualdade histórica. Por acaso seria mais justo ou, ou sequer lógico, dividirmos igualmente a riqueza da nação entre ricos e pobres? Ou pelo contrário, justiça seria os que têm menos receberem mais, ao passo que os que já têm muito recebam menos, até o ponto em que haja igualdade, para aí sim iniciar-se uma distribuição igualitária da fortuna nacional?
Quem acha que já há igualdade dentro das nossas fronteiras, ou sequer dá bola para isso, certamente não vê cabimento em benefícios reestruturantes como o bolsa-família; inclusive sente-se injustiçado. Entrementes, os que acreditam que para o Brasil ser um país mais igualitário é necessário afrontar subversivamente a desigualdade com uma desigualdade do seu tamanho, desde que estrategicamente, e em benefício da maioria – algo como um maquiavelismo invertido, isto é, popular -, o bolsa-família é o princípio inédito da justiça em terras tupiniquim.